É cada vez mais comum encontrar casais que não têm filhos, mas tem um pet, um cão ou gato a quem toda a atenção, carinho e também os gastos são direcionados. Nos Estados Unidos, esta categoria de família acabou ganhando até mesmo uma sigla: DINKWAD (renda dupla, sem filhos e com cachorro, na sigla em inglês). No Brasil, cerca de 21% dos casais com bichinhos não tem filhos, segundo a pesquisa Radar Pet 2020, da Comissão de Animais de Companhia (Comaq), do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Saúde Animal (Sindan). Uma pesquisa do Consumer Affairs, de 2022, ainda mostrou que cerca de 58% dos millenials preferem ter um um animal de estimação a um bebê. Diante desta nova configuração familiar, de pais e mães de pet, quando esses relacionamentos se desfazem, quem fica com o animal?
Camila Dias, advogada de Minas especialista em Direito de Família, explica que no Brasil a legislação sobre o direito dos animais é escassa. “No que se refere ao direito de família inerente aos animais, na hora do divórcio, eles, os pets, são tratados num primeiro momento como objetos e entrariam na partilha dos bens materiais. Mas isso vem mudando bastante”, observa.
Hoje, algumas decisões, segundo ela, acabam comparando os pets a filhos ao estabelecerem a guarda compartilhada do animal, prevista no Código Civil.
Para evitar esses “malabarismos jurídicos”, recentemente especialistas do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) recomendaram, em um artigo, o uso do termo ‘custódia’ e não guarda para resolver impasses, visto que a palavra ‘guarda’ se refere sempre a um indivíduo.
Segundo Camila Dias, o ideal é sempre que o casal tente resolver o problema entre si; chegue a um consenso sobre o que acham mais justo em relação ao animal de estimação. Ela alerta que é importante que este acordo seja formalizado; sendo redigido por um advogado especialista, que vai levá-lo ao poder judiciário para homologar. “Agora, se não houver consenso, o jeito é acionar a justiça e tentar provar de toda maneira que aquele bichinho não é um objeto semovente [bem material], e sim um membro de uma família multiespécie. A pessoa deve levar todos os documentos, provas, imagens, vídeos e fotografias mostrando que o bichinho é um membro da família, para assim garantir os direitos, por exemplo, aos alimentos”, detalha Dias.
Segundo ela, se não há consenso, tudo pode acontecer: o juiz pode, por exemplo, entender que o animal é apenas um objeto e a responsabilidade fica somente a cargo daquele que detém a posse desse animal. “Alguns tribunais têm entendido que o animal pertence àquele que consta na nota fiscal ou no registro do pet, sendo considerado como legítimo dono. Já outros tribunais avaliam o que é melhor aos interesses do animal, como a maior afinidade, melhor estrutura física, disponibilidade e a habilidade para cuidar dele”, explica a advogada.
Camila Dias esclarece que o juiz pode ainda entender que o pet é um membro da família. Neste caso, haveria o compartilhamento das despesas e das responsabilidades.
A advogada revela que, atualmente, há decisões, inclusive do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, estabelecendo a guarda compartilhada dos pets. “Porém o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, em 2021, que as despesas com o custeio da subsistência, da sobrevivência dos animais, são obrigações que dizem respeito à condição de dono”, destaca Dias.
Projetos de leis tratam do tema
Segundo uma estimativa da Petlove, só em Belo Horizonte existem cerca de 1 milhão de pets. Em Minas a população de cães e gatos é estimada em 10,1 milhões, sendo 7 milhões apenas na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
Atualmente, há uma proposta de lei, que tramita na Câmara dos Deputados, que prevê a possibilidade de guarda compartilhada de animais. O PL 4375/2021, de autoria do deputado Chiquinho Brazão (Avante-RJ), também trata da obrigação das partes de contribuir para a manutenção dos animais de estimação.
Outro projeto mais recente, o PL 179/2023, quer reconhecer a família multiespécie como entidade familiar. A proposta, de autoria dos deputados Delegado Matheus Laiola (UniãoPR) e Delegado Bruno Lima (PP/SP), aguarda parecer do Relator na Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família (CPASF).
O que fazer em relação ao pet em caso de separação?
- 1 – Busque um acordo com seu ex.
- 2 – Se houve consenso, sobre quem fica com o pet, formalize o acordo na justiça com a ajuda de um advogado.
- 3- Caso não exista acordo, busque um advogado de sua confiança. Recolha provas diversas em fotos, vídeos e comprovante de gastos que mostrem a importância do pet como integrante da família e que também certifiquem o valor necessário para a sobrevivência mensal do animal.
- 4- Lembre-se que, na ausência de uma legislação específica, cada caso é único. O juiz pode pedir, por exemplo, avaliações comportamentais para determinar quem é a pessoa mais indicada para cuidar do bichinho. E pode ser que, mesmo que você não permaneça com o animal, tenha que custear os gastos dele.
Fonte: O Tempo.